05 agosto 2009

Uma produção tosca

Ninguém se importa se você dorme mal, se não vai bem de saúde ou se sua mente está em farrapos, ninguém se importa com seu dia ruim, com sua baixa qualidade de vida, com seus problemas e com sua felicidade, ninguém se importa se você pensa em se matar ou se arrumou um bom emprego, se chora com a luz apagada e abafando os soluços num travesseiro sem fronha.
Somos todos números dos quais o resto das pessoas não enxergam nenhum tipo de expectativa, de oportunidade e esperança.
Faz doze dias que não vejo o sol e há doze dias que não produzo uma sequer fagulha de alguma coisa e no meio de todo o meu ócio, consumindo minha própria compulsividade, recorro aos livros, discos, filmes, papéis e rebusco qualquer coisa, procuro ler, ouvir e ver atentamente, mas nada torna-se prazeroso e a comida tem um gosto insosso, como todas as obras que alguém custou a produzir como custaram a cozinhar e eu me faço de mal agredecido e reclamo de tudo como um velho, chato que já viveu demais e espera amargurado seu fim, nada trágico e clássico, nada comovente, é só uma regra da vida: morrer, assim... por ter vivido demais, por já ter dado o tempo de cumprir o que tinha como objetivo ou de se frustrar.
Chorei sem nem se quer saber quais eram meus motivos, bocejava de tanto tédio e fazia um drama numa incoerência, sem sentido algum.
Eu tinha o mundo nas mãos, mas não poderia alcançá-lo, tinha o que todos gostariam de ter: tempo.
Só que o tempo deixa a gente meio maluco, pensando demais e de pensar acaba se intristecendo e da tristeza faz seu dilema e se torna insociável, inadequado, intolerável até o dia que ninguém te convida para tomar um chá, para ir numa festa e sua namorada até esquece que você existe, de tão ausente que você se torna e ela não liga, não convida mais pra sair, não te namora mais e você chora porque sabe que falta algo e você também não sabe o que é de tanto tempo que não a vê!
E aí resolve relatar todas essas coisas enfames que não cabem no espaço com você, porque você o tornou pequeno demais e fica insuportável dividi-lo com quaisquer coisas que sejam...
Já estou pensando em vender esses móveis, a Televisão e alguns livros... Até a Cozinha tem muitas coisas, não preciso mais, essa louça toda suja vou jogar pela janela pra me poupar tempo e assim, posso arrumar uma desculpa para sair de casa: comprar louça nova ou comida congelada que já vem em embalagens descartáveis, mas ainda tenho de comprar talheres.
Não não, gosto de comprar louças! Poucas coisas tem me dado prazer como ouvir pratos sendo estraçalhados, vidros dos copos sendo moídos e pisoteados como um acidente...
É, vou comprar chicletes, quem sabe eu faça uma obra de arte com esses cacos e torne menos despresível o meu dia, uma produção tosca...

3 comentários:

K. disse...

Quem sabe a arte, mesmo em uma produção tosca ajudasse a achar paz e felicidade novamente :)

Unknown disse...

Caraca Muito bom mesmo ;DDD

Pablo Vinícius disse...

Pré-vestibulanda, pai de família, velho entediado... Quem é você, afinal?